quarta-feira, 6 de julho de 2011

Não falo nada

Lugar maravilhoso. Céu azul e limpo. Montanhas e montanhas de areia ao fundo. Vento muito sutil. Só ela e eu.
Dançavamos empolgados por uma substância que deveria ser proibida, mas arranjamos um esquema de sentir tudo aquilo.
Eu de boné, ela de presilha no cabelo. Puxei ela pra mim e, levemente, joguei seu corpo pra trás, segurando em sua cintura. Ela levantou uma das pernas e quase tocou seu cabelo no chão. Uma dança bonita, evolvente e muito gostosa - pelo menos pra gente era -. Ao retornarmos a dança, a sensação foi violenta e arrebatadora. Senti suas unhas elevarem minhas costas até a minha nuca e eu segurando seu rosto e seu pescoço tudo junto, com as mãos encaixadas em suas orelhas. Nos beijávamos sem parar.

- "Essa parada é muito boa!" - Eu pensei.

Ensaiamos mais alguns passos. Estava muito quente. O tempo, o sol e a areia.
Mentalizei fortemente todas aquelas caras que ela fazia, para eu nunca mais esquecer. Eternizei em mim as imagens e aquela sensação. Penso nunca mais conseguir tanto prazer.

Entramos no mar e lá brincamos e dançamos ainda mais. Aquela sensação de alegria só ia aumentando. Tinhamos conseguido uma droga poderosíssima! Capaz de trazer alucinações, vertigens, prazer intenso, vontades absurdas de fazer qualquer loucura. O amor é, pra mim, a pior droga descoberta.

Voltamos para nossa casa em SP e seguimos nos amando, nos preenchendo, nos confortando, nos apoiando, enfim, tudo aquilo que uma droga pode trazer de bom. O tempo foi passando e as dosagens foram aumentando desenfreadamente, era demais! E eu queria sempre mais! Ela, aparentemente, também! O que eu não tinha conhecimento, é que uma droga, depois de um efeito prolongado, ela causa diversos tipos de danos a diversas pessoas, não só aos usuários, mas à família, amigos, etc. Todos envolvidos indiretamente acabariam tendo algum tipo de transtorno.

O tempo passou numa velocidade incrível que não percebi que meu vício havia se tornado um incômodo.
Os problemas cegados inicialmente vieram a tona numa explosão avassaladora de volumes altos, melancolia, sentimentos de culpa, tristeza, arrependimentos, despejos de agressão e ferimentos incicatrizáveis. Como dizem, é muito difícil largar uma droga. Senti isso na pele. Sinto ainda, eu acho.

Decidimos parar, por um tempo, de continuar o uso desse entorpecente e nos afastamos.

Estive contaminado, adoeci, surtei, eu precisava daquilo tudo de novo, em doses controladas, para me manter saudável e desfrutar o prazer absurdo que ela me oferecia. Estava em reabilitação, monitorado pela minha consciência, pelos meus receios de tanto transtorno causado na minha vida.

Abstinência quebrada. O vício, acreditava eu, estava sendo controlado, mais uma ilusão.
O sol que brilhou trazendo-a pra mim, foi o mesmo que ofuscou sua visão e a colocou em sua escuridão. Eu queria estar lá, pra fazer tudo certo dessa vez, eu queria que ela fosse capaz disso também, mas o que é certo? O que é ser capaz? O que é essa droga? Existe uso controlado? Dá pra criar tantos acordos assim?
Não sei as respostas de muitas perguntas, evito errar, mas arrisco, no meu tempo, para, enfim, acertar. Foi assim mesmo, cheio de vírgulas. Espero não ser mais. Eu. Assim.

Eu falaria sobre o tempo. E o quanto ele é importante com diferentes significados pra cada pessoa. Preciso do meu. Você precisa do seu. Eles precisam do tempo deles. Suas decisões são tomadas no seu tempo. As minhas, no meu. Talvez exista um meio termo. Ou não. Existe uma receita, um manual?
É obvio que meus amigos e parentes me apoiarão em minhas ideias. Eu as construí, eu as vendi. Todos vão apoiar minha decisão, menos o meu coração. O mesmo vale pra você. Pra ele. Pra ela. E quando a consciência pesa, não há amigo, mãe, médico ou pai que tirará essa dor. Talvez resolver seja solução. Talvez.

Eu não entendo nada do amor. Achar que entende ou entender mais ou menos, é muito pior que assumir a ignorância. Torna-se ainda mais egoísta e orgulhosa a pessoa que não querer lidar com as situações formadas entre ambos. As situações nunca são ditadas somente por um lado. Críticas desordenadas conduzem, quase sempre, ao cinismo. E é aí que a razão se perde. Em meio as ironias e volumes desajustados.

O sol vai nascer, brilhar, se pôr e nada que fizermos vai mudar isso. O que temos em mãos, cabe somente a nós decidirmos o que fazer. Não fazer nada também é uma escolha. Boa ou ruim? Não sei falar sobre isso.

Eu falaria sobre filosofia, falaria sobre psicologia, falaria sobre a origem do mundo, mas eu não entendo de nada disso também. Eu falaria sobre nós, falaria sobre você, falaria sobre mim, mas eu também não entendo nada. É só sobre isso que eu falo. Que não sei de nada. Que eu não entendo nada. Sou incompleto.