segunda-feira, 31 de outubro de 2011

O Inventor

Cabelos pretos e bagunçados, típico de maluco. Andava de um jeito acelerado. Atrasado, derrubava os papeis pelo salão principal do prédio que morava.
Enquanto pegava um ponhado de papel que caia, derrubava as chaves de casa e do carro, perdia mais tempo se apressando do que se arrumando. E não ligava pra nada disso.
Por diversas vezes deu de cara com o vidro que separava o hall do prédio da escada da portaria. Mas nem se dava conta, achava tudo normal.
"Bom dia, tudo bem?!" tímido, representava isso só com um balançar da cabeça, pro porteiro e pra moça do Yakult. Abria o porta malas do carro e arremessava toda papelada e sua mochila lá. Do jeito que caia, ficava.

Ele sabia que era motivo de chacota da molecada do prédio e percebia que alguns adultos evitavam entrar no mesmo elevador que ele, mas não se abalava a princípio, mudava o foco do pensamento e já lembrava de alguma canção. Só queria chegar ao seu destino e fazer suas coisas. O resto era só o resto mesmo.

No toca fitas do seu carro tocava artistas que só ele conhecia. Canções de blues, rock anos 80 e, em dias mais cinzas, desligava o som. Na ida ou na volta também curtia as rádios AM que ficam passando notícias o dia todo.
Ele odiava semáforos vermelhos, calculava sua velocidade para pegar todos verdes até a avenida principal. Aí de lá fugia de seu controle. E no controle ele queria estar sempre. Gostava de prever, calcular hipoteses e arriscar. Não era um cara de muitos amigos, mas era admirado por quem "o conhecia". Uma pena ele não saber disso.

Ele morava sozinho, não se sabe como chegou ao condomínio, raras vezes pedia uma pizza e recebia uma visita. Os volumes de seu apartamento eram moderados e suas contas estavam sempre em dia.
Não gostava de baladas, nem de televisão. Não bebia e não fumava.

Aos domingos, colocava sua bermuda azul escuro de 'tactel', seu tênis branco e uma camiseta qualquer para caminhar no parque. Saia pontualmente às 7h para caminhar. Dados exatos 30 minutos de caminhada, ele se sentava em um banco onde o sol podia alcançá-lo e ficava olhando.

Seus óculos embaçam por causa do suor, arrisca ficar sem eles por diversas vezes, mas só enxerga cores em movimento. Desiste, recoloca os óculos, apoia os cotovelos nos joelhos, cruza as mãos cutucando uma folha e olha, só olha. Olha tudo a sua volta.

A garota de patins, o gordinho suado, o bombado na barra, a molecada com uma bola, um casal com o cachorro, o chafariz, a menina e seu livro na grama, o garoto com seu violão, o gurizinho e sua pipa,  a gordinha e o sorvete, o ambulante e sua pochete, a gostosa de sainha, a bicicleta e a corrente, a senhora e sua garrafinha de água, o grupo de dança, o segurança e seu rádio, a faxineira e sua vassoura, a nuvem e o céu, o vento e as árvores, ele, o banco, tudo isso e seus pensamentos desalinhados.

Levanta, decide caminhar mais um pouco, dessa vez no contra-fluxo dos que estão correndo.
Leva algumas esbarradas, mas segue firme. Repara alguns olhares de reprovação por estar na 'contramão', mas não para. O ritmo dos seus passos começam a ganhar velocidade e segue. Olha para o chão e olha pra frente respirando em bit acelerado. Conta quantos passos está dando e quantas pessoas passam por ele. Metódico, inventando novas manias. Quinze passos e 8 pessoas. Três mulheres e cinco homens. Trinta passos, vinte pessoas. Segue aumentando o ritmo e levanta o pescoço para que o vento refresque seu rosto. Um, dois. Um, dois. Um, dois. 
Adora a sensação.

- "Cuidaadoo!" - Alguém grita.

Ele tropeça em alguma coisa e cai. Por lá fica alguns instantes.
Alguns riram impulsivamente.
Outros se desesperaram.
Alguns fingiram que não viram.
Outros ficaram com pena.
Alguns acharam 'bem feito!'.
Outros queriam ajudar.
Alguns sabiam o que fazer.
Outros não arriscaram estender o braço.
A maioria se aproximou pra ver o que estava acontecendo. E só ficaram olhando. E olhando.

Ele abriu os olhos calmamente, não dirigiu uma palavra a ninguém. Levantou pacientemente, recolocou seus óculos levemente retorcidos, olhou a expressão das pessoas que estavam ao seu redor, com os braços abriu espaço para passar no meio daquela muvuca, ouviu um pedido de desculpas sendo gritado ao fundo, um burburinho qualquer e seguiu curtindo o vento em seu rosto. Ganhando velocidade no contra-fluxo. Um, dois. Um, dois. Joelhos e cotovelos levemente ralados ardiam e se refrescavam na brisa que recebia.
Quanto mais rápido, mais refrescante, menos dor.
Quanto mais lento, menos refrescante, mais dor.
Pensou.

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Trinta e uma linhas

Eu tenho dois segredos que guardo no meu peito
Um é poesia, outro uma canção.
Prosa, rima e versos suaves para o ouvido
Peso, melancolia e desespero para o coração.

Um tem o ritmo que quisermos recitar
Outro tem levada forte que não dá pra controlar.
É canibal e doloroso, é sereno e prazeroso.
É certeza e quente, é duvidoso e inconsequente.

Eu tenho dois segredos que guardo comigo
É catástrofe e confortante, é paz e perigo.
É pressa e ansiedade, é garoa com sol no sábado a tarde.
É heterogêneo e uniforme, é um mix que não dorme.

É agito da madrugada na mata do interior
É silêncio na balada, o frio que passa calor
É segredo e não conto,
É um grito de amor, um conto.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Não falo nada

Lugar maravilhoso. Céu azul e limpo. Montanhas e montanhas de areia ao fundo. Vento muito sutil. Só ela e eu.
Dançavamos empolgados por uma substância que deveria ser proibida, mas arranjamos um esquema de sentir tudo aquilo.
Eu de boné, ela de presilha no cabelo. Puxei ela pra mim e, levemente, joguei seu corpo pra trás, segurando em sua cintura. Ela levantou uma das pernas e quase tocou seu cabelo no chão. Uma dança bonita, evolvente e muito gostosa - pelo menos pra gente era -. Ao retornarmos a dança, a sensação foi violenta e arrebatadora. Senti suas unhas elevarem minhas costas até a minha nuca e eu segurando seu rosto e seu pescoço tudo junto, com as mãos encaixadas em suas orelhas. Nos beijávamos sem parar.

- "Essa parada é muito boa!" - Eu pensei.

Ensaiamos mais alguns passos. Estava muito quente. O tempo, o sol e a areia.
Mentalizei fortemente todas aquelas caras que ela fazia, para eu nunca mais esquecer. Eternizei em mim as imagens e aquela sensação. Penso nunca mais conseguir tanto prazer.

Entramos no mar e lá brincamos e dançamos ainda mais. Aquela sensação de alegria só ia aumentando. Tinhamos conseguido uma droga poderosíssima! Capaz de trazer alucinações, vertigens, prazer intenso, vontades absurdas de fazer qualquer loucura. O amor é, pra mim, a pior droga descoberta.

Voltamos para nossa casa em SP e seguimos nos amando, nos preenchendo, nos confortando, nos apoiando, enfim, tudo aquilo que uma droga pode trazer de bom. O tempo foi passando e as dosagens foram aumentando desenfreadamente, era demais! E eu queria sempre mais! Ela, aparentemente, também! O que eu não tinha conhecimento, é que uma droga, depois de um efeito prolongado, ela causa diversos tipos de danos a diversas pessoas, não só aos usuários, mas à família, amigos, etc. Todos envolvidos indiretamente acabariam tendo algum tipo de transtorno.

O tempo passou numa velocidade incrível que não percebi que meu vício havia se tornado um incômodo.
Os problemas cegados inicialmente vieram a tona numa explosão avassaladora de volumes altos, melancolia, sentimentos de culpa, tristeza, arrependimentos, despejos de agressão e ferimentos incicatrizáveis. Como dizem, é muito difícil largar uma droga. Senti isso na pele. Sinto ainda, eu acho.

Decidimos parar, por um tempo, de continuar o uso desse entorpecente e nos afastamos.

Estive contaminado, adoeci, surtei, eu precisava daquilo tudo de novo, em doses controladas, para me manter saudável e desfrutar o prazer absurdo que ela me oferecia. Estava em reabilitação, monitorado pela minha consciência, pelos meus receios de tanto transtorno causado na minha vida.

Abstinência quebrada. O vício, acreditava eu, estava sendo controlado, mais uma ilusão.
O sol que brilhou trazendo-a pra mim, foi o mesmo que ofuscou sua visão e a colocou em sua escuridão. Eu queria estar lá, pra fazer tudo certo dessa vez, eu queria que ela fosse capaz disso também, mas o que é certo? O que é ser capaz? O que é essa droga? Existe uso controlado? Dá pra criar tantos acordos assim?
Não sei as respostas de muitas perguntas, evito errar, mas arrisco, no meu tempo, para, enfim, acertar. Foi assim mesmo, cheio de vírgulas. Espero não ser mais. Eu. Assim.

Eu falaria sobre o tempo. E o quanto ele é importante com diferentes significados pra cada pessoa. Preciso do meu. Você precisa do seu. Eles precisam do tempo deles. Suas decisões são tomadas no seu tempo. As minhas, no meu. Talvez exista um meio termo. Ou não. Existe uma receita, um manual?
É obvio que meus amigos e parentes me apoiarão em minhas ideias. Eu as construí, eu as vendi. Todos vão apoiar minha decisão, menos o meu coração. O mesmo vale pra você. Pra ele. Pra ela. E quando a consciência pesa, não há amigo, mãe, médico ou pai que tirará essa dor. Talvez resolver seja solução. Talvez.

Eu não entendo nada do amor. Achar que entende ou entender mais ou menos, é muito pior que assumir a ignorância. Torna-se ainda mais egoísta e orgulhosa a pessoa que não querer lidar com as situações formadas entre ambos. As situações nunca são ditadas somente por um lado. Críticas desordenadas conduzem, quase sempre, ao cinismo. E é aí que a razão se perde. Em meio as ironias e volumes desajustados.

O sol vai nascer, brilhar, se pôr e nada que fizermos vai mudar isso. O que temos em mãos, cabe somente a nós decidirmos o que fazer. Não fazer nada também é uma escolha. Boa ou ruim? Não sei falar sobre isso.

Eu falaria sobre filosofia, falaria sobre psicologia, falaria sobre a origem do mundo, mas eu não entendo de nada disso também. Eu falaria sobre nós, falaria sobre você, falaria sobre mim, mas eu também não entendo nada. É só sobre isso que eu falo. Que não sei de nada. Que eu não entendo nada. Sou incompleto.

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Eu queria ser um segredo

O desconhecido é sempre um segredo que alguém não revelou. E quem não é curioso o bastante para se interessar por um segredo? E se esse segredo for seu e nem você mesmo conheça o conteúdo?

Metade da minha vida utilizei umas máscaras para conseguir algumas coisas: amigos, um emprego, uma garota, um real, uma hora de atenção, enfim... usava todo aquele arsenal de personalidades que um ser humano pode utilizar, as famosas "máscaras". Famosas máscaras que ninguém gosta de admitir que usa.

Fechei o livro deixando o marcador de páginas na 46, faltava ainda mais da metade pra terminar de lê-lo. Fui atender meu celular e recebi um convite inusitado em pleno início da madrugada. Topei!
Quinta pra sexta-feira, coloquei minha fantasia de baladeiro e saí com a Laura, amiga que saio desde que tenho uns 14 anos, passei na casa dela e fomos a um bar jogar sinuca.


Lá encontramos alguns amigos meus e amigos e amigas dela. A maioria, por sinal, já se conheciam, só eu não sabia desse universo de amizades em comum. A princípio foi divertido.
Com o passar das horas e das bitucas arremessadas na sarjeta, minha fantasia de baladeiro foi se desfazendo e eu fui colocando a minha fantasia de conquistador. O porque, ao certo, não sei. A troca foi suave, mas rápida, poucos amigos próximos perceberam.
Ainda na área de fumantes, pendurei um sorriso falso abaixo do meu nariz para me aproximar dela. Ela me olhou três ou quatro vezes seguidas com aquele aspecto: "Você vai vir aqui perto mesmo? Ah.. por favor, não!"... e eu senti que ela também pendurava um sorriso falso quando a abordei e iniciei um papo qualquer.

Chequei no meu banco de dados um assunto que possivelmente pudesse surpreender, impressionar... hum.... em vão. Todos os assuntos que eu dominava, ela também dominava e quando ela arriscava algum papo diferente, eu sabia do que ela estava falando. Isso se tornou engraçado. Como um bom estrategista, aproveitei esse gancho. Tínhamos muitas coisas em comum. Conversamos durante quase uma hora sem interrupções -somente para encher o copo-.
Eu só percebi que não estava mais com a fantasia de conquistador quando eu quase avancei para beijá-la. Minha ideia inicial era que acontecesse o contrário. Foi quando decidi ir embora. Talvez a fantasia dela de conquistadora tenha sido mais elaborada. Vazei.

Logo pela manhã do dia seguinte, voltando do centro de São Caetano, encontrei minha amiga Laura no semáforo da Av. Goiás com a Amazonas. Na verdade ela me encontrou. Ela estava voltando do curso de inglês a caminho do ponto de ônibus. Quando parei no semáforo, tomei um puta susto com ela batendo no vidro: 
- Ae cabeção, me dá uma carona!

Ela entrou no meu carro sorrindo e perguntando com uma fantasia de ironia:

- Pra onde você foi ontem que nem me deu tchau?
- Ué... eu fui pra casa, por que?
- Sei.. pra casa... fala a verdade!
- Fui pra casa mesmo... sério. Eu estava com dor de cabeça de ficar lá.
- Hum. Tenho um recado pra você.

Passou pela minha cabeça que algum amigo meu quisesse falar comigo, sei lá, mas foi um recado estranho. Eu não estava fantasiado de 'Cara Preparado Pra Receber Um Recado' e deixei minha face responder o quão feliz e confuso fiquei com a notícia.
- Ihh... pelo jeito você gostou dela também, né?! - Laura me disse.

"Malditas expressões corporais! Logo eu que fico analisando todo mundo deixo escapar uma dessas! Fraco!" - pensei.
- Aham... normal. Achei ela legal. - respondi.

Contei algumas coisas que conversamos, ponderando nas palavras, vestindo um verdadeiro traje 'mediador', de maneira que ela deixava escapar algumas informações que eu julgava importantes para minha, então, quase conquista.

Quando chegava perto da casa de Laurinha, ela pede para eu encostar o carro porque quer me contar uma coisa. Senti que ela vestia uma dramaturga de segunda. Suspense!

- Edu, o que você tem?
- Como assim?
- Sério, você fica sempre na defensiva. Se abre comigo. Eu sempre falo tudo pra você, sinto que não é recíproco. Espero que não se ofenda, mas eu gosto muito de você e acho, sinceramente, que você também tenha uma consideração por mim.
- La, de boa, não tenho nada, sério. Adoro você, óbvio, mas não sei do que você está falando. (fantasiado de sínico)
- Tem um tempo que queria ter esse papo com você. Do que você tem medo? Por que se esconde tanto dentro de si mesmo?
... fiz uma pausa tenebrosa. Ela havia quebrado mais um disfarce meu e eu não conseguia pensar em nada pra virar o jogo. Há algum tempo eu vinha percebendo que minhas máscaras ficavam cada vez mais fixas em mim. Arrisquei:
- Então, Laurinha, não sei porque você tem essa impressão. Eu conto as coisas da minha vida sim, só que não são do modo como você conta ou, talvez, do modo que você gostaria de ouvir.
- Hum... - silêncio -. Beleza. Podemos ir nessa.

Ela se voltou pra frente e colocou o cinto esperando que eu ligasse o carro. Óbvio que percebi a decepção dela com a minha resposta "grosseira"... eu diria "direta". Fomos em silêncio até a casa dela.

- Tó. Esse é o telefone da Ariane. Ela falou pra você ligar pra ela. Desculpe se te incomodei.
- Tranquilo. Valeu.

Arranquei com o carro e vi, pelo retrovisor, ela sentando em frente sua casa, fitando meu carro. Não entendi porque não tinha entrado pra casa... então resolvi dar a volta no quarteirão pra ver se estava tudo bem mesmo.

Passando novamente pela casa dela, estava somente o material do inglês. Achei estranho. Olhei pra todos os lados da rua, fui atrás da caçamba de uma obra que acontecia na rua dela e nada também. Dei uma olhada entre os tapumes da construção, mas estavam bem fechados. Peguei seu material e toquei a campainha uma vez. Duas vezes. Pela terceira vez e.... desisti. Aguardei uns cinco minutos na rua pra ver se ela aparecia e nada... Pensei em ligar pra ela, mas, pra variar, meu celular havia ficado embaixo da minha cama recarregando a bateria.

Eu sempre ando com um cartão telefônico para certos imprevistos, porém eu não sabia o telefone dela decor. Procurei rapidamente alguma coisa no material dela, vi que tinha um livro do mesmo autor do livro que eu lia, mas não achei mais nada. Foi quando veio o 'click!': "Vou ligar pra Ariane, explicar a situação e pedir o telefone da Laura. Vou parecer ridículo, mas dane-se. Vou com a fantasia de 'não me importo com nada' e é por uma causa boa."

- Ariane?
- Alô? Ela mesma, quem é?
- Oi Ariane, é o Eduardo... amigo da Laura, sabe?
- Eduardo...? Eduardo...?
"Pra cima de mim não! hahahaha" - Pensei. Eu sabia que ela sabia quem era, lancei:
- Ah.. Nada não... Deixa pra lá, então. Eu~
- Não! Não! O Eduardo de ontem do bar, né?! Da sinuca?
- Isso.. eu mesmo. (risada maléfica interior: Muaahahaha! I´m win!)

Ela me contou que acordou bem, não tinha notícias da Laura, mas que tentaria ligar pra ela.
Ariane estava morando na casa de uma tia solteira, aqui em São Caetano mesmo, ambas dariam uma festa naquela noite e me convidou. Disse que convidaria Laurinha também.

Passei a tarde inteira dormindo me recuperando da noite anterior e pensando como a Laura tinha esquecido o material do inglês dela. Nem me passou pela cabeça qualquer desgraça. Sempre acho que as pessoas são mais esquecidas, burras, do que passíveis de um ato de violência... até porque notícia de desgraça voa.

Dormi muito. Acordei quase oito da noite. Jantei. Tomei banho. Me troquei. Aí liguei pra Laurinha pra passar na casa dela pra buscá-la. Não me atendeu. Liguei pra Ariane que disse ter falado com a Laura e ela já estava a caminho. Justo! Peguei meu carro, liguei o GPS. Passei no mercado. Comprei umas bebidas e fui pra casa da Ariane. Com uma fantasia de quem iria se dar bem naquela noite, desliguei meu celular pra nenhum amigo vir atrás de mim.

Chegando no prédio da Ariane, toquei o interfone:
- Boa noite. Vou no apartamento 92.
- Seu nome?
- Eduardo.
- Ah sim. Pode subir...

"Caramba! Será que tem uma lista de convidados?" - pensei

Toquei a campainha e aguardei. Ariane veio me receber. Mais linda ainda agora, eu comigo sóbrio. Me convidou pra entrar.

- Ué. Tudo bem? Cadê o pessoal, a Laurinha?
- A Laurinha ligou desmarcando e o resto do pessoal não veio.
- E sua tia? 
- O ex-marido dela ligou querendo conversar... e ela, capachona, foi.
- Então~
- ~Então só veio você. Por mim não tem problema. Por você tem? - ela dizendo, já sabendo minha resposta, se virava em direção a cozinha.

Fixaram na minha mente aqueles olhos claros realçados por aqueles cabelos ruivos... Afe! Não tive escolha. Tomamos uns dois drinks. Conversamos bastante. Ela desligou a TV. Não colocou nenhuma música. Abriu a cortina da sala pra luz da lua entrar e sentirmos uma leve brisa. As luzes da sala estavam acesas. Aliás, da casa inteira estava. Nesse cenário claro e estranho, atípico para um romance, ela foi, vagarosamente, despindo todas as minhas fantasias. Rebatia todas os meus questionamentos. Quebrava mais uma e outra máscara minha. Eu tirava lentamente sua roupa de timidez também. Ela levantava para tirar os meus sapatos de superioridade. Abri botão por botão de sua calça de ansiedade. Ela arrancou com violência minha camisa hipócrita. E fomos nos descobrindo.

Ela me fez contar coisas que eu não sabia. Eu queria ser um segredo e ela me revelou.

Logo pela manhã fui até a cozinha preparar um café da manhã pra gente, sem fantasia. No canto da cozinha, perto da fruteira vi os livros da Laura jogados no chão, estranhei, pois haviam ficado no meu carro. Eu tinha certeza!

Quando voltei pro quarto com a bandeija na mão, curioso pra saber dos livros, Ariane estava sorrindo e pulando na cama me convidando pra ir com ela. Sorrimos, nos abraçamos, pulamos, cansamos e dormimos de novo. Exaustos.

quarta-feira, 9 de março de 2011

Isso é só para poetas

Esses dias estava com vontade de escrever uma poesia. Comecei a falar de amor. O clichê dos poetas. Então acho que comecei bem.

Me arrisquei a viajar por dizeres entre aspas, onomatopéias e metáforas nunca antes mencionadas, sentimentalidades fúteis ou não.

Escolhi uma música - aleatoriamente - pra fazer plano de fundo para minha inspiração,

“Verá que, mesmo de longe, tua lixa não me rasga mais.
Teus nós só eu sei desatar. Desiluda-se.
Tua vontade faz querer me encontrar pra sempre. O outro pra sempre.”

Mas não consegui poetizar nosso amor tipo B. Daqueles que todos sonham em não ter.
De acordo comigo, amar é querer somar e dividir, nunca multiplicar ou subtrair. E era demais! Os dois! Os exageros e os meandros de conduta que tínhamos a cada náufrago. E como afundou!

“Afundei-me em cada sorriso teu.
Afoguei-me no teu suor.
Me sufoquei nos teus cabelos
E morri nas nossas lágrimas.”

Bem assim mesmo, nos teus pros seus, dos ‘–me’ pro ‘me–‘.

Mas nada da poesia aparecer! Eu insistia em redigi-la, compô-la, papealizá-la, enletrá-la...
Parei de justificá-la. Seria como equacionar o amor. E esse amor, de fato, não tem solutiva, não tem razão, não tem sentido, só tem um X.

E esse X é de errado.

mas não deu certo, obvio. Não sou um poeta.

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Sonho, pesadelo e a realidade

Os anos passam rápido demais, mas as semanas demoram muito.
Foi um, dois ou três anos querendo e sonhando com a cumplicidade, imaginando ideais compartilhados. Como é bom viver nos sonhos, né?! Ideologia.
Você já viveu aquela sensação de sorrir ao ver um sorriso? Sorrir tanto de achar que seu peito não vai aguentar, de seus olhos se arregalarem de tanta satisfação? Suas mãos suarem levemente? E tudo por causa de um sorriso compartilhado? E quando o sorriso é acompanhado de um abraço? Aquele abraço que faz o mundo parar, perder a noção do tempo, suas pernas tremerem, esquentar, seus batimentos cardíacos superarem sua respiração. Sabe?

Foi só um pesadelo. Calma.

Dei um pulo da cama querendo saber o que eu tinha sonhado. Estava ofegante e preocupado. Abri a janela pra luz entrar e sentei na cama. Fiquei atrapalhado de sono e com a cara amassada. Fechei os olhos e busquei entender o que tinha acontecido.
Um porta retrato. Um céu azul. Um vestido branco. Um par de óculos escuros. Um abraço molhado. Sal. Vento. Era só o que eu conseguia lembrar. Olhei para o relógio e já estava atrasado para ir trabalhar.

Tomei um banho rápido. Minhas roupas já estavam no mancebo do meu quarto. Peguei as chaves e fui trabalhar sem tomar café.
No caminho, durante o trânsito, olhava - com mais curiosidade do que de costume - os carros que passavam ao meu lado na busca de algum sinal que conflitasse com o meu sonho - supersticioso, ou não?rs - . Passou uma mulher, com seus 40 e poucos anos, se maqueando no espelho retrovisor interno, um caminhoneiro comendo um pão francês com algum recheio, um casal cantando e dezenas de sonolentos e curiosos como eu.
Atrasado por atrasado, resolvi tomar um café na padaria (e um lanche de queijo branco quente).

No balcão reparei a agilidade dos atendentes e a alegria com que trabalhavam, sempre sorrindo e brincando um com os outros.
Do outro lado do balcão sentou uma moça loira, cabelos enrolados, vestida socialmente, maqueada ao tom do rosa mais claro que existe, bonita. E só. Pediu um chá gelado e um lanche natural.

Ela olhava a TV com ar de recriminação ao ver o sensacinoalismo que tratavam as enchentes e crimes pela cidade. Talvez tivesse notado que eu estava a observar seus movimentos, ficou olhando para seu copo de uma maneira que eu sabia que ela conseguia me ver. E ficou assim durante alguns segundos e eu imóvel também.

Nesse momento entrou um garoto negro, com uns 12 anos, camisa do flamengo e um pacote de balas de uvas na mão. Ofereceu de mesa em mesa, de balcão a balcão. Quando chegou em mim o garoto pediu para eu pagar-lhe um lanche.

"- Um bauru e uma coca cola para o menino aqui." - pedi.

O guri, Rafael, morava em um bairro próximo. Me contou que sua mãe havia falecido há pouco mais de 3 meses e que ele e mais dois irmãos precisavam trabalhar para não acabar como o pai - morto por policiais em uma fuga-.

Nesse bate papo rápido notei que a loira ficava a contemplar nossa conversa. Quando olhei pra ela, ela fez sinal de 'sim' com a cabeça e se aproximou.

- Oi menino. Tudo bem? Vi que o papo de vocês estava bom, desculpe atrapalhar. Mas me interessei pelo que conversaram. Meu nome é Hellen e trabalho em um programa de TV e gostaria de saber mais sobre você.

Quando terminei meu lanche, o guri já não estava mais por perto.

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Planeta Terra da garoa

Está também cansado de ver os desastres que a chuva está causando? Têm visto as massivas reportagens com jornalistas dizendo e gritando: "A Natureza está revoltada!"? Seus vizinhos colocam a culpa em S. Pedro? É culpa do aquecimento global? Do Governo?

Agora, olha só. O nível da água mundial sempre foi e sempre será o mesmo. Não é lógico? (Desconsiderando a hipótese de importar água de outros planetas.)

1 litro de água evaporado será um litro de água sempre. A diferença é que tiramos a água do solo e não damos espaço pra ela voltar. Cavamos até dezenas de metros para alcançá-la e construímos tudo em volta com concreto e asfalto. Não precisa ser muito inteligente pra entender isso, né?!

Criamos estradas, derrubamos as árvores, construímos barreiras, afunilamos e canalizamos rios. E consumimos água. Muita água! Temos mais pessoas do que 50 anos atrás. Consumimos mais água do que 50 anos atrás e vedamos o chão, o não acontecia 50 anos atrás.

Não adianta criarmos piscinões, aumentarmos a largura dos rios ou colocarmos toalhas nas nuvens. Esqueceram do ditado “tudo que sobe, tem que descer”? Ah vá! É muita burrice.

A culpa não é de S. Pedro, nem da Natureza – ela sempre foi assim: aquece, evapora e chove.- “Ah! Mas agora tem o aquecimento global!” – vão dizer. Ou... “Evapora lá, mas chove aqui.”
Pergunto: Você vai comprar pão a pé ou de carro? Você pratica coleta seletiva? Tem e usa uma bicicleta para meio de transporte (não lazer). Utiliza bens reciclados? Sabe como reduzir poluentes do seu carro? Sabe como foi o processo de fabricação dessa calça que você está usando? Se não soube responder algumas dessas perguntas, a culpa das enchentes é sua. Você é um dos vilões do aquecimento global.

Acredito que com controle e planejamento do consumo, natalidade e progresso as coisas seriam diferentes.
Homem é bicho burro. Ele é culpado. Eu não acredito que tenha mais jeito de consertar. A água vai sim acabar com tudo. Ou melhor, nós vamos acabar conosco. E estamos avançando com esse processo.